Relendo o texto para publicá-lo aqui no blog faria várias outras mudanças, e me parece que este primeiro texto não flui assim naturalmente, já do segundo gostei mais do resultado, mas enfim...depois do desabafo, deixo o julgamento das traduções a vocês, meus fantasmas. Primeiro, publico o texto italiano. Na próxima semana coloco aqui aquele traduzido do inglês.
UMA GOTA
Uma gota d'água sobe os degraus da escada. Consegue escutá-la? Deitado na cama no escuro, percebo o seu misterioso caminhar. Como é que ela faz? Saltita? Tic, tic, ouve-se intermitentemente. Em seguida a gota para e talvez pelo resto da noite não dê mais notícias. Todavia sobe. Galga degrau por degrau, ao contrário das outras gotas que caem perpendicularmente, em obediência à lei da gravidade, e ao final fazem um pequeno estalo, bem conhecido em todo o mundo. Esta não: segue devagar ao longo da escadaria letra E deste interminável edifício.
Não fomos nós, adultos refinados e muito sensíveis, a identificá-la. Mas uma doméstica do primeiro andar, pequena esquálida e ignorante criatura. Notara uma noite, muito tarde, quando todos já dormiam. Pouco depois não resistiu, levantou-se e correu para acordar a patroa. "Senhora" sussurrou "senhora!" "O que é?" disse a patroa, despertando "O que aconteceu?" "É uma gota, senhora, uma gota que tá subindo as escadas!" "Como?" perguntou a outra, confusa. "Uma gota que sobe os degraus!" repetiu a doméstica, e quase começou a chorar. "Essa agora" praguejou a patroa. "Tá maluca? Vai dormir, marcsch! Você bebeu, é isso, sua sem-vergonha. É esse o tanto de vinho que falta na garrafa de manhã! Sua imunda, se você pensa que..." Mas a mocinha fugira, devidamente escondida debaixo das cobertas.
"Quem sabe o que se passa na cabeça daquela estúpida" pensou depois a patroa, em silêncio, tendo já perdido o sono. E escutando involuntariamente a noite que dominava o mundo, ouviu também o curioso ruído. Uma gota que subia as escadas, realmente.
Metódica que é, por um momento a senhora pensou em sair para olhar. Mas o que poderia ver à miserável luz das lâmpadas escurecidas que pendem do corrimão? Como localizar uma gota em plena noite, com aquele frio, pelos lances tenebrosos?
Nos dias seguintes, de família em família, o boato espalhou-se lentamente e agora todos no prédio já estão sabendo, mesmo se preferem não comentar, como se fosse uma coisa boba da qual talvez envergonhar-se. Desde então, muitos ouvidos estão atentos, no escuro, quando cai a noite para oprimir o gênero humano. E há quem pense em uma coisa, quem pense em outra.
Certas noites a gota silencia. Em outras, ao contrário, por longas horas não faz nada além de deslocar-se, sobe, sobe, como se não fosse parar. Os corações se aceleram no momento em que o passo suave parece tocar a porta. Ainda bem, não se deteve. Lá vai ela, distanciando-se, tic, tic, em direção ao andar de cima.
Com certeza, sei que os inquilinos do mezanino a esse ponto pensam estar seguros. A gota – eles creem – já passou em frente à sua porta, não poderá mais perturbá-los; Outros, como eu que estou no sexto andar, têm agora motivos de inquietude, tanto quanto eles. Mas quem lhes disse que nos próximos dias a gota irá retomar o caminho do ponto que atingiu a última vez, ou melhor, não irá recomeçar lá de baixo, iniciando a viagem dos primeiros degraus, sempre úmidos e escuros de abandonada imundície? Não, nem mesmo eles podem se considerar seguros.
De manhã, saindo de casa, olha-se atentamente se por acaso ficou algum rastro. Nada, como era previsível, nem a menor marca. De manhã, no entanto, quem leva essa história a sério? Ao sol da manhã o homem é forte, é um leão, mesmo se poucas horas antes hesitava.
Ou aqueles do mezanino teriam razão? No entanto nós, que antes não percebíamos nada e nos considerávamos imunes, há algumas noites também ouvimos qualquer coisa. A gota está longe ainda, é verdade. Chega a nós somente um tique-taque levíssimo, triste eco através das paredes. Todavia é sinal de que está subindo e cada vez mais perto.
Mesmo dormindo em um quarto interno, longe da escadaria, não adianta. É melhor perceber o rumor do que passar as noites em dúvida se a gota está lá ou não. Quem mora naqueles quartos isolados às vezes não resiste, espreita em silêncio nos corredores e permanece à entrada no frio, atrás da porta, com a respiração suspensa, escutando. Se a ouve, não ousa distanciar-se, escravo de medos indecifráveis. Pior ainda se está tudo tranquilo: neste caso como descartar que, uma vez de volta à cama, não comecem os rumores?
Que vida estranha, afinal. Não poder reclamar, nem tomar providências, nem achar uma explicação que acalme os ânimos. E não poder nem mesmo persuadir os outros, dos outros edifícios, que não sabem de nada. Mas que coisa seria então esta gota: - perguntam com exasperante boa fé - um camundongo, talvez? Um sapo vindo do subsolo? Na verdade, não.
E então - insistem - seria por acaso uma alegoria? Querer-se-ia, por assim dizer, simbolizar a morte? ou algum perigo? ou os anos que passam? Nada disso, senhores: é simplesmente uma gota, só que ela sobe as escadas.
Ou mais sutilmente pretende-se representar os sonhos e as quimeras? As terras almejadas e distantes onde se presume que esteja a felicidade? Enfim, alguma coisa de poético? Não, absolutamente.
Ou então os lugares mais distantes ainda, nos confins do mundo, os quais nunca alcançaremos? Mas não, digo a vocês, não é uma gozação, não existem duplos sentidos, trata-se - ai de mim - mesmo de uma gota d’água e, pelo que se presume, à noite sobe as escadas. Tic, tic, misteriosamente, degrau por degrau. E por isso se tem medo.
Dino Buzzati Traverso (16/10/1906 a 28/01/1972) escritor italiano, segundo alguns mais conhecido no exterior que no próprio país
porra alemão, a vida é dura. mas tu não pode usa esse texto pra outras paradas, tipow, concursos e tal? a gente leva pau mas um dia a gente chega lá. nós aqui ninguém é troxa mano! auhauhauha. abraço aeh!!
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