domingo, 27 de dezembro de 2009

Exercícios de tradução



"Todo o mundo é viúvo se é verdade que caminhas ainda
todo o mundo é viúvo se é verdade! Todo o mundo
é verdade se é verdade que caminhas ainda. todo o
mundo é viúvo se não morres! Todo o mundo
é meu se é verdade que não estás vivo mas só
uma lanterna para meus olhos oblíquos. Cega permaneci
do teu nascimento e a importância do novo dia
não é que noite pela tua distância. Cega sou
se tu caminhas ainda! cega sou se tu caminhas
e o mundo é viúvo e o mundo é cego se tu caminhas
ainda agarrado aos meus olhos celestiais"

Amelia Rosselli (1930-1996), poetisa italiana

Traduçao minha

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Do futuro

Bebo uma cerveja. O frio passa em frente à minha janela. As luzes do quarto apagadas. Eu olho pela janela. Eu penso.

Outro gole. Tiro os óculos e de repente minha visão se embaça. Vejo luzes e escuros desfocados. O frio passa. Olho pro relógio: é tarde, muito tarde. Eu penso.

O computador toca Cafe Tacuba. É incrível como a língua espanhola é melancólica, e ao mesmo tempo tão bela. Outro gole. E eu penso no futuro.

O futuro...o futuro promete e ao mesmo tempo distancia. O futuro poderia ser belo como uma música do Cafe Tacuba. Poderia ser simples. Mas a simplicidade não combina com Deus. Deus exige o complexo, o caos, a provação. Deus exige atenção.

Deus exige.

Outro gole. Abro a janela e o frio entra e me envolve. Me deixo ficar. O futuro está próximo. El futuro es mañana. Una mañana linda...

A cerveja termina. O frio continua. O futuro, em um mês, dará provas de existência. "Espero que Deus não seja tão sarcástico comigo", estava escrito no livro.

"Amém", disse o poeta, últimas palavras, lucidez completa.

Depois, silêncio. 

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Aquele ali

Eu sou um narrador em terceira pessoa. Embora agora eu esteja falando de mim, o que me desmente, estou aqui pra falar de outro. Aquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso. A mao, no singular. A outra nao tà no bolso.

Aquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso, neste momento procura alguma coisa no bolso da camisa, com a outra mao que nao estava no bolso, embora agora esteja, mas em outro. E muito embora eu seja um narrador em terceira pessoa, o escritor que me criou e que criou também aquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso, nao me fez onisciente. Quer dizer que eu nao sei dizer o que se passa na cabeça daquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso. Também nao sei seu nome, nem ao menos o que procura no bolso. E se por acaso aquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso, resolver ir embora, nao poderei mais dizer nada a seu respeito.

A outra mao daquele ali, que tà sentado na mureta com a mao no bolso, que procurava qualquer coisa no outro bolso, o da camisa, a outra mao saiu de là, segurando um maço de cigarros.

Com um cigarro na boca aquele ali, que tà sentado na mureta, agora nao tem mais nenhuma mao em bolso algum, porque a mao que estava dentro do bolso saiu de là com um isqueiro pra acender o cigarro daquele ali, que agora està fumando, ainda sentado na mureta.

Aquele ali, sentado na mureta, fumando, tirou o òculos de sol pra coçar os olhos e virou a cabeça pro outro lado da mureta, botou de novo os òculos e coçou o saco com a mao que estava primeiro no bolso. A outra mao jogou a bituca fora, e entrou no outro bolso, enquanto a primeira mao daquele ali, que coçava o saco em cima da mureta, ajudou a dar o impulso pra sair da mureta e entao aquele ali, que tava na mureta com a mao no bolso, atravessou a rua e dobrou a esquina.

Aquele ali, que jà nao està mais na mureta, que coçou o saco e jà dobrou a esquina, aquele ali ninguém sabe de seu fim. Nao sabemos nem ao menos se a outra mao ainda està no bolso. Ou se coça o saco pelo furo do bolso. Ou se fuma outro cigarro, colocado na boca pela primeira mao, que no inìcio estava no bolso.

A ùnica coisa que sei è que nao tem mais ninguém ali.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Às cinco

Quando o sino da Igreja soa, é já noite, e o frio envolve a cidade de Pisa no inverno, como um cachecol de gelo.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O inferno de Dante (e de Shakespeare, e de Camões...e o meu também)


A correria destes últimos dias tem sido grande. Leio muito e tenho que começar a tomar cuidado pra não embaralhar tudo que to lendo. Mas enfim, como já disse algum nobre filósofo, é a vida.
Falando em nobreza, não que eu seja nobre, embora seja Dalla Corte (hein hein?), enfim, piadas infames à parte, como eu dizia, falando em nobreza, hoje em um seminário do mestrado o professor deu um exemplo muito certeiro, que achei legal compartilhar aqui com vocês, meus fantasmas.
Contextualizando o ocorrido: o professor nos deu cópias de trechos de MacBeth, de Shakespeare, na versão original, e depois confrontava estes trechos primeiro com uma “tradução” prum inglês moderno (fraca, por sinal) e depois com várias traduções feitas em diferentes  épocas para o italiano. Viam-se coisas absurdas.
Aí entra a questão do distanciamento, não somente entre duas línguas diversas (ou culturas diversas, pra ser mais preciso), como também o distanciamento temporal na mesma língua, ou seja, querendo ou não o inglês da época de Shakespeare não é o inglês de hoje, assim como o italiano de Dante diverge do italiano de Gérson.
Neste momento o professor perguntou: é justo traduzir Shakespeare para uma linguagem moderna?
Antes de eu começar a pensar na resposta, aconteceu uma discussão, mas entre professores. Nunca vi isso no Brasil, mas aqui é normal (ou pelo menos parece) um professor assistir a aula do outro e não só, discutir e questionar o que o outro está propondo. (Creio que se ocorresse no Brasil, depois da aula um diria pro outro, po, ta querendo me fuder na frente dos alunos? Aqui eles discutem, e embora parecesse que o professor fosse dar meia-volta, permaneceu na sala)
Enfim, não to aqui também querendo dizer que todas as intervenções são oportunas. Na verdade ninguém entendeu porra nenhuma do que o cara tava dizendo, e perderam preciosos minutos da aula por uma discussão vã e inútil. Só sei que finalmente o tal professor conseguiu uma brecha pra explicar melhor.
Disse ele, diante da argumentação fervorosa das outras professoras, que Shakespeare escrevia o inglês comum à época, da plebe, não o inglês dos nobres. Da mesma forma, Dante, que foi um dos primeiros senão o primeiro a escrever em latino volgare (que virou o italiano de hoje), escreveu na língua do povo, de outra forma teria escrito em latim, a língua oficial à época. Ou seja, a tradução à linguagem moderna de certa forma seria um retorno ao objetivo inicial do bardo inglês, que era falar a língua do povo. As professoras se chocaram de novo...
E o professor, meio que pra alfinetar de vez, explicava que no futuro, daqui uns 200 ou 300 anos Bob Dylan e Elvis Presley serão estudados pelos cientistas como hoje fazemos com esses poetas antigos. E a língua de hoje será tão arcaica a eles quanto é Camões e Os Lusíadas pra nós ou Cervantes e Dom Quixote pros Castelhanos. Uma professora, que sentava na fileira logo atrás da minha murmurou “Bob Dylan, sinceramente...”. Eu ria sozinho.
No fim o professor disse: “Il tempo nobilta”. Foi um certo neologismo, pois usou o substantivo nobiltà e o utilizou como verbo, embora exista o verbo nobilitare, que é tornar nobre. Uma tradução mulambenta seria O tempo nobra. Em suma, o tempo enobrece. O que era popular torna-se elitizado, torna-se nobre. Vimos isso durante toda a história da humanidade, não só com escritores, mas também na música (um exemplo o jazz), em manifestações populares (ex. o carnaval) e com políticos (depois de mortos, são todos respeitáveis). Poderia citar outros exemplos vários, mas não vem ao caso agora.
Portanto, não adianta escrever com pompas e circunstâncias. Depreende-se que o popular será eternizado e, posteriormente, adorado pelas gerações futuras de intelectuais, cujos filhos farão caretas aos professores quando tiverem que estudar Bob Dylan no segundo grau e, o pior, pro vestibular.


O mais importante, na verdade, e no final,  é que o tempo nobra. Mas a verdade é outra, e diversa.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Resolvido o maior problema do século

Durante este tempo que estou aqui na bota, mais de um ano, aprendi o nome de várias comidas, que com saudade da culinária brasileira eu procurava aqui. Mas uma coisa eu nunca descobri: como se chama o chuchu em italiano.

Chuchu nao tem gosto, eu sei, mas fazer o que, é bom. E meus dicionários sempre me negavam a tradução desta palavra. Até hoje.

Usando um pouco a testa, ao invés de traduzir diretamente pro italiano, resolvi procurar na língua dominante do mundo, e descobri que chuchu em inglês cham-se chayote. Daí, sabendo que a italianada gosta de puxar o saco do tio sam (quando nao traduzem uma palavra, usam em ingles mesmo), coloquei no dicionário chayote e em italiano o nosso famoso chuchu chama-se zucchina centenaria. Zucca em italiano é abóbora. Seria alguma coisa como abobrinha centenária.

Agora nao me perguntem o porque de tudo isso.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Sem tempo

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

...

Tanto, tanto...

Muito.

Mesmo.

E basta!

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Teorias de traduçao e estudos culturais pòs-coloniais

"(...) Figured in the disjointed signifier of the present, this supplementary third space introduces a structure of ambivalence into the very construction of Jameson's internationalism. There is, on the one hand, a recognition of the interstitial, disjunctive spaces and signs crucial for the emergence of the new historical subjects of the translational phase of late capitalism. However, having located the image of the historical present in the signifier of a 'disintegrative' narrative, Jameson disavows the temporality of displacement which is, quite literally, its medium of communication. For Jameson, the possibility of becoming historical demands a containment of this disjunctive social time."
Homi K. Bhabha - How newness enters the world: Postmodern space, postcolonial times and the trials of cultural translation in The Location of Culture. London ; New York: Routledge, 1994

Nao sei porque tudo isso me faz lembrar do Fabuloso gerador de lero-lero, que tanto me inspirou na graduaçao e a tantos ainda inspira.(digite no google pra descobrir do que se trata)

domingo, 22 de novembro de 2009

Domingo

O domingo hoje passou lento. Pouca gente. Pouco movimento.

Nem as moscas, a me encher a paciencia, apareceram

O domingo foi tao lento, mas tao cheio de nada, que pra se ter uma idéia de que nao poderia ser mais monòtono, nao recebi nem mesmo um spam no meu email. Nem unzinho.
Pois é, amigo. Tem dias em que o dia nao passa.

E esse dia é hoje.

* * *

James Joyce, Jorge Luis Borges, Samuel Beckett e Vladimir Nabokov. Segundo um critico italiano, esses 4 definiram as coordenadas mentais da narrativa no século XX. Seja là o que isso quer dizer.

Coordenadas mentais...é interessante este uso de termos vagos que soam bem e impoem um certo respeito ao texto. Uma coordenada mental ninguém sabe o que é, deduz-se que seja algo como "estrutura psicològica da narrativa", ou padroes, sei là. Acho que fiquei mais vago ainda.

Mas o importante é o que importa, o resto é o que sobrou. E a verdade é outra e diversa. Ou nao.

O futuro...no domingo vazio se pensa muito no futuro. E é logo ali.

sábado, 21 de novembro de 2009

O pendulo de Foucault


Depois de meses lendo o famigerado exemplar acima nominado, finalmente terminei de ler o livro de Umberto Eco. No meu antigo blog devo ter feito alguns posts comentando do livro.

O final da leitura de livros gigantescos como esse (mais de 600 pag) sempre sao interessantes. O livro, aliàs, começa perto do fim e o narrador aos poucos desenvolve a historia contando o que aconteceu atè ele chegar onde està. E isso se estende por mais da metade do livro. Depois, o final è inicialmente arrebatador, mas me decepcionei na ultima pagina. Pareceu que o Eco nao sabia como terminar e decidiu por fim ao livro de um modo um pouco reticente, sem tanta emoçao.

Ao mesmo tempo que eu terminava de ler, fazia minha primeira traduçao pro mestrado, que era um excerto do Otelo de Shakespeare, do Ingles arcaico pro italiano. Me debati durante uma semana sobre o livro e, especialmente, sobre esse trecho. Um dia antes de terminar a traduçao faltavam 2 frases que eu nao achava um resultado satisfatòrio. Aì resolvi tomar uma cervejinha pra refrescar a cuca e tudo se resolveu.

A pròxima semana serà minha primeira aula do mestrado, em que verei o real resultado de tudo isso, e começo a analisar as vantagens e desvantagens de um mestrado em duas lìnguas estrangeiras. Veremos.

Entao transcrevo a voces, em primeira mao, o excerto do Ato V Cena II do Otelo no original em ingles e na minha traduçao em italiano, pra nao deixar esse blog abandonado às moscas:

LODOVICO: You must forsake this room, and go with us:
Your power and your command is taken off,
And Cassio rules in Cyprus. For this slave,
If there be any cunning cruelty
That can torment him much and hold him long,
It shall be his. You shall close prisoner rest,
Till that the nature of your fault be known
To the Venetian state. Come, bring him away.

OTHELLO: Soft you; a word or two before you go.
I have done the state some service, and they know’t.
No more of that. I pray you, in your letters,
When you shall these unlucky deeds relate,
Speak of me as I am; nothing extenuate,
Nor set down aught in malice: then must you speak
Of one that loved not wisely but too well;
Of one not easily jealous, but being wrought
Perplex’d in the extreme; of one whose hand,
Like the base Indian, threw a pearl away
Richer than all his tribe; of one whose subdued eyes,
Albeit unused to the melting mood,
Drop tears as fast as the Arabian trees
Their medicinal gum. Set you down this;
And say besides, that in Aleppo once,
Where a malignant and a turban’d Turk
Beat a Venetian and traduced the state,
I took by the throat the circumcised dog,
And smote him, thus.

[Stabs himself.]

LODOVICO: O bloody period!

GRATIANO: All that’s spoke is marr’d.

OTHELLO: I kiss’d thee ere I kill’d thee: no way but this;
Killing myself, to die upon a kiss.

[Falls on the bed, and dies.]

CASSIO: This did I fear, but thought he had no weapon;
For he was great of heart.

LODOVICO: [To Iago] O Spartan dog,
More fell than anguish, hunger, or the sea!
Look on the tragic loading of this bed;
This is thy work: the object poisons sight;
Let it be hid. Gratiano, keep the house,
And seize upon the fortunes of the Moor,
For they succeed on you. To you, lord governor,
Remains the censure of this hellish villain;
The time, the place, the torture: O, enforce it!
Myself will straight aboard: and to the state
This heavy act with heavy heart relate.

[Exeunt.]


Aqui embaixo a minha traduçao:

LUDOVICO: Deve abbandonare questa camera, e venire con noi:
Il suo potere e il suo comando sono finiti,
Adesso Cassio governa a Cipro. In quanto a questo malfattore,
Se si conosce crudeltà
Che può tormentarlo tanto e per molto tempo,
Sarà sua. Deve rimanere prigioniero,
Finché lo Stato Veneziano conosca
La natura dei suoi crimini. Venite, portatelo via.

OTELLO: Un attimo; due parole prima che partiate.
Ho fatto alcuni servizi allo stato, e lo sanno.
Basta. Vi prego, nelle vostre lettere,
Quando racconterete queste sventure
Parlate di me come sono; senza eccessi,
Né malizia: dovete parlare
Di uno che non ha amato saggiamente, però molto;
Di uno che non è facilmente geloso, però essendo stato provocato
Divenne confuso all’estremo; di uno la cui mano,
Come l'indegno Indiano, butta via una perla
Più ricca di tutta la sua tribù; di uno i cui occhi repressi,
Sebbene non abituati ai sentimenti più teneri,
Sparsero lacrime così rapidi come gli alberi arabi
Fanno con la loro gomma medicinale. Scrivete questo;
E inoltre dite, che una volta in Aleppo,
Quando un malvagio turco in turbante
Picchiò un veneziano e diffamò lo Stato,
Presi per la gola il cane circonciso
E lo colpii in questo modo.

[si accoltella]

LUDOVICO: Oh, che fine sanguinosa!

GRAZIANO: E’ stato inutile quel che abbiamo detto.

OTELLO: Ti ho baciato prima di ucciderti: così è stato;
Mi uccido, per morire sul tuo bacio

[cade sul letto e muore]

CASSIO: Avevo paura di questo, ma ho pensato che non fosse armato;
Perché è stato un uomo di gran cuore.

LUDOVICO: [a Iago] Oh, cane spartano,
Più crudele dell’angoscia, la fame o il mare!
Veda il tragico fardello su questo letto;
Questo è opera sua: l'oggetto avvelena la vista;
Nascondiamola. Graziano, la casa adesso è sua,
E conservi le ricchezze del Moro,
E’ il suo successore. Lei, Signor Governatore,
Deve giudicare questo diabolico mascalzone;
L’orario, il luogo, la tortura: Oh, lo faccia soffrire!
Io vado direttamente a bordo: e allo stato
A malincuore racconterò questo pesante atto

[Escono.]


Traduzir é um pouco cansativo. Mas é melhor do que trabalhar em um banco e em um hotel.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Shakespeare


"DESDÊMONA - Estou certa de que meu nobre esposo me considera honesta.

OTELO - Oh, sim! Sem dúvida! como as moscas no açougue, que recebem vida da podridão. Ó erva daninha, tão bela ao parecer e tão cheirosa que ofendes os sentidos! Oh! se nunca tivesses vindo ao mundo!"

Iago é o mais vil dos biltres. E Shakespeare é legal.

No fundo, no fundo, me divirto com tudo isso. Mas o fundo, é o outro lado. Que começa.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O uivo


Na madrugada fria abro a janela do quarto. O rio em minha frente. O vento gelado me congela, mas me deixo ficar. E ouço ecos distantes, que confundem-se. Uns mais altos, outros mais baixos. As ruas estão desertas, os bares estão fechados, a pessoas se trancam no calor da solidão italiana.

Os ecos me intrigam. Olho o rio, que reflete luzes esparsas. Hoje fez sol. Amanhã? Nem a previsão do tempo sabe.

Amanhã é outro dia. Ontem voei sobre a torre de Pisa. Amanhã conquistarei impérios. Hoje foi o meu exílio. E eu não sei mais se volto pro espaço ou pro fundo do mar.

Pois meu nome é querer.

Pois meu nome é impronunciável. Pois meu nome é intraduzível.

E entre os bosques dos Alpes, nas neves eternas, com a lua ao fundo e o céu estrelado, ouve-se o uivo de um lobo. Um lobo que enxerga o mundo pelo alto. Um lobo que se esconde da vida. Um lobo que foge do medo e vê no futuro algo disforme, impreciso, que o atrai.


Um abismo.

E ele se chama urgência.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Penso, logo existo

A prova de admissão ao mestrado será essa semana. Na verdade, eu ainda nem sei se farei essa prova, porque antes de tudo isso tem uma análise curricular que pode me excluir definitivamente do certame. E a lista de quem faz a prova sai na quarta. A prova será na sexta. E eu to começando a pegar mais pesado nas minhas traduções doidas. E to ficando doidim, doidim,

E nessa pira, que sempre me leva a mudar de direção, porque começo a traduzir um texto, busco uma palavra no dicionário, mas dali já passo por uma outra interessante que sempre quis saber e assim vai infinitamente e quando vejo traduzi muito pouco do texto que eu me propunha, embora de alguma forma também tenha adquirido algum conhecimento igualmente útil.

Enfim toda essa ladainha foi porque eu tava nessa pira, tá ligado?, de viajar nos dicionários e de repente me deparei com a famosa frase de Renè Descartes, que é o título desse post (tenho que descobrir uma tradução pro termo post). Mas no original em latim, que seria "Cogito ergo sum". O legal do dicionário em italiano que comprei é que, como o italiano é a língua mais próxima do latim dentre as línguas latinas (português, espanhol, francês, catalão, romeno e italiano, isso sem contar os infinitos dialetos em cada país), enfim, o dicionário italiano tem um apêndice só com termos e locuções em latim, o que é interessante pra caramba, pra quem gosta disso como eu. Mas não era por aí que eu ia.

Voltando à vaca fria, fiquei me perguntando como seria o famoso termo "cogito ergo sum" em outras línguas. E nessa hora a wikipedia é insuperável. Em poucos cliques você descobre que em eslovaco se diz "Myslím, teda som" embora eu não faça idéia de como se pronuncia isso. Em inglês: "I think, therefore I am". Em italiano "Penso, quindi sono" ou "Penso, dunque sono", o que dá na mesma. E seguindo essa linha de raciocínio me veio novamente uma dúvida que me surgiu muitos anos atrás quando eu ainda estudava inglês. E se o tradutor entendeu tudo errado?

Pense bem, pateta: em inglês o verbo to be, assim como em italiano o verbo essere tem dois significados, ser e estar. E alguém dirá "mas o Descartes era Francês, animal!". Eu sei disso, besta. E muito embora eu não saiba francês pra afirmar se o mesmo acontece com a frase original (se é que ela não foi escrita em latim mesmo), ainda assim a tradução pro italiano e pro inglês são ambíguas. É óbvio que o contexto da obra ajuda a definir melhor a escolha das palavras, mas eu imagino na minha maluquice se por acaso algum tradutor um dia não bebeu demais enquanto traduzia Shakespeare e entendeu o to be or not to be, that's the question erroneamente, quando o bardo inglês queria (ou quereria) dizer estar ou não estar, eis a questão.

Imagina quantas guerras e quantos mal entendidos no mundo ocorreram por erros de tradução. Imagina o trabalho do intérprete do Lula pra traduzir em outras línguas suas piadinhas futebolísticas. É passível de um desentendimento diplomático, tudo isso! E se o mundo não passa de um erro de tradução, meu deus!

Mas eu me divirto, na verdade. Embora nesse caso, não creio que a verdade seja outra. Contudo pode ainda ser diversa.

E tenho dito!

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O fim da madrugada



No alvor do frio dos dias da cidade secular
Dos ventos, das gotas do orvalho que me circundam
O rio e a chuva que de umidade a cidade inundam
O outono das folhas mortas a alma congela devagar

Na madrugada ociosa, silente e abandonada,
nas alamedas desertas, nos becos escuros
abraça a cidade, como os antigos muros,
a voz sôfrega que jaz eternizada

pelos ecos, que dos sinos a toada
acompanha. A sombra, do nada,
surge sem que ninguém a veja

E sucumbe sob os raios da alvorada,
ouve-se o pranto de um'alma desgarrada
e o desespero pela última cerveja

domingo, 18 de outubro de 2009

A dubitável certeza





Ler antes do
tempo

Crer.
A ciência de saber-se possível.
Superestimar
o ego.

O nulo.

Querer
e não ter
a certeza
Poder
e não possuir
a firmeza
Fazer
e desconhecer
o impossível

Demasiado.
Simples assim.

Exerço o meu
erro
Execro
meus acertos

E amo
a instabilidade
do porvir

Saber e ser
o que se é
anula a dúvida

Saber e ser
o que se queria ser
e o que se queria
saber.

Nada

E o fundo do escuro do mundo
é a sombra do vento
a perfumar
a cor dos dias
que já foram

E o rei da cocada preta
disse "Vamo nessa"

lhe respondi com uma careta
"Mas a verdade é outra, e diversa"

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O retorno de Zaratustra

Depois de quase dois anos longe, retorno a este endereço. Talvez tenha sido um belo equìvoco ter saìdo daqui. Talvez nao.

Dizem por aì que o bom filho à casa retorna. E cà estou, ora pois.

Mas a verdade é outra e diversa.