Não me lembro extamente quando ouvi falar de Henry Charles Bukowski pela primeira vez, nem a primeira coisa que li dele. Com certeza foi entre 1998 e 2003, quando o dito já estava morto (isso em 1994). Tenho alguns livros seus, todos em português, todos em prosa.
Me lembro que cheguei a criar, durante a faculdade, a década Bukowski, que se não me engano deve terminar em 2014. A data certa será relembrada no momento justo e oportuno.
Uma vez achei um livro que me chamou a atenção pela capa, e em algum poema perdido pelos blogs da vida eu o citei como uma "garrafa de Bukowski 25 anos".Trata-se de um livro bilíngue, ou seja, original em uma página, tradução na seguinte. A tradução era uma porcaria, e isso eu consegui identificar ainda àquela época, muitos anos antes de resolver fazer essa doideira que é o mestrado em tradução que to fazendo. E o título obviamente é passível de objeções. 25 melhores poemas na opinião de quem, cara-pálida?
Mas foi o primeiro contato com as poesias Bukowskianas. Que eu gostei, claro. Mesmo porque, até então, só havia lido as prosas em que ele mesmo se auto-declarava um poeta. Mas um poeta sem livros traduzidos pro português (pelo menos eu nunca tinha achado um, com exceção deste infeliz exemplar já comentado). E o que achei mais interessante em suas poesias, além da melancolia, é uma característica estritamente estética, que consiste em mudar de linha em um ponto não comum da frase, quebrando o ritmo, deixando a leitura como as vidas ali retratadas, tortas e mancas, deixando as palavras que finalizam essas mesmas frases sozinhas, como ele, o poeta misantropo.
Eis que, aqui na Itália, enquanto passeava por uma livraria virtual, achei algo que não pude resistir, e comprei. Uma seleção de poemas do grande poeta das garrafas, do turfe, das mulheres e da solidão, de 1951 a 1993. Embora não seja do Paulo Leminski, o livro é um catatau: 557 páginas contendo em torno de 270 poesias, no original em inglês, sem aquelas traduções sem-graça pra encher o saco. Duzentos e setenta poemas. Pouco, quase nada, se compararmos com as mais de mil poesias que a Wikipedia afirma que ele escreveu (não custa relembrar ao leitor desavisado que o prêmio nobel José Saramago também consulta esta grande obra virtual da sabedoria, como comprova esse post no seu blog oficial, o que sempre a nós, meros mortais, libera a consciência de eventual culpa ou preguiça).
O nome do livro do Buk, pra quem se interessar, é The pleasures of the damned, que eu traduziria em um primeiro momento como "Os prazeres dos danados", embora o damn em inglês tenha também outras acepções tenuamente diversas desta, mas enfim, discutir o título não levará a lugar nenhum, pelo menos nesse momento.
Enfim. Charles Bukowski é aquele que, como Dalton Trevisan, Pedro Juan Gutierrez, Rubem Fonseca e outros mais nos fazem lembrar que a vida não é essa coisinha bela que muitos queriam que fosse. Que se você não ficar esperto, a vida te aniquila como eu aniquilei nesse momento um mosquito com meu dedo.
Aí embaixo, um dos poemas, traduzido por mim:
Seguros
a casa dos vizinhos me deixa
triste.
ambos marido e mulher acordam cedo e
vão ao trabalho.
chegam em casa no início da noite.
têm um pequeno menino e uma menina.
pelas 21h todas as luzes na casa
se apagam.
na manhã seguinte ambos marido e
mulher acordam cedo de novo e vão ao
trabalho.
retornam no início da noite.
pelas 21h todas as luzes se
apagam.
a casa dos vizinhos me deixa
triste.
as pessoas são boas pessoas, eu
gosto deles.
mas sinto que estão se afogando.
e não posso salvá-los.
eles sobrevivem.
eles não são
sem-teto.
mas o preço é
terrível.
às vezes durante o dia
eu olho para a casa
e a casa olha para
mim
e a casa
chora, sim, é verdade, eu
sinto isso.
a casa está triste pelas pessoas que ali
moram
e eu também
e olhamos um ao outro
e carros passam pra lá e pra cá
na rua,
barcos atravessam o porto
e as altas palmeiras cutucam
o céu
e esta noite às 21h
as luzes se apagarão,
e não somente naquela
casa
e não somente nesta
cidade.
vidas seguras se escondem,
quase
paradas,
a respiração dos
corpos e pouco
mais.
quinta-feira, 1 de abril de 2010
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Quantos números, mas enfim beber uma garrafa de bukowski de 25 anos é sempre embreagador...hahaha!
ResponderExcluirbeijos.
Muito bom alemão. Eu já tinha visto esse livro, um amigo meu tem, mas eu não tinha idéia do lance da tradução. Sei que o que vc traduziu eh show de bola. falowww aeh alemao, akele abraço!
ResponderExcluirZaratrusta passei pra retribuir a visita e digo que se você for avaliar as poesias do Hélio pelas do Bukowski a surra vai ser grande. Espero que apareça por lá outras vezes, até porque não é só poesia que temos no Máquina de letras.
ResponderExcluirO Bukowski foi-me apresentado por um colega de curso da empresa em 2001. Delá pra cá li vários trabalhos dele e digo que minha forma de olhar os livros mudou bastante de lá pra cá.
Moço um abraço e boa sorte com a vida.
Eu fui apresentada ao Bukowski pelo meu amigo L.S. Alves que deixou o comentário acima. No início, fiquei um pouco chocada com a maneira que ele escreve. E hoje estou cada vez mais fascinada com os escritos dele. Gostei muito desse poema que você traduziu. Parabéns! Um abraço.
ResponderExcluirEste livro foi o primeiro que li de poesias do bukowski, achei a tradução um pouca estranha, mas como não sou muito bom em inglês e não consegui encontrar outro livro o li diversas vezes, ficou na memória, agora a LP Pm pocket lançou um livro de poemas dele o "O Amor é um cão dos diabos" que gostei muito, parabéns pelo blog.
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