quinta-feira, 6 de maio de 2010

A terra sem volta

À noite, quando todos os Gattopardos são negros, e a cegueira é luz que guia o reino; quando os postes se apagam e a ilusão retorna; quando o exagero não mais é sentido como um excesso, mas como adendo: nessa hora incerta e obscura, a opacidade surge, enfim, triunfante.

Nessas horas a horda de bárbaros crê na dissonância circunspecta de uma pretensa algazarra, quase um dilúvio, êxtase a reverberar junto aos campos e o concreto. Vejo silhuetas insinuantes, vejo caminhos convexos. O mundo como um astigmatismo.

Pensar, neste momento, é exercício ridículo. As feições de quem pela gente se afeiçoa, como um blended scotch, com o tempo maturam, com o tempo melhoram, com o passar do tempo, se recuperam. O alçar do vôo à quintessência.

As pernas roçam em mim. Aquelas pernas lisas e sedutoras, lascivas, lânguidas, encostam na epiderme em cicatrização. O frenesi, o frêmito do desejo.

Na treva do quarto, o Gattopardo vê. No canto onde a sombra da porta enegrece o mundo. O suspiro.

A procura cessa, por um momento. A eternidade da dúvida ressurge, abarca o pensamento, como um abismo infindo engole, impiedoso, a ansiedade.


O piscar do olho iluminado na escuridão.

Publicado em 26 de janeiro de 2008

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